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Aug 7 2012

Branko Neskov: mixando no Brasil

Quem acompanha o cotidiano da pós-produção do cinema brasileiro, sempre esteve acostumado com o flerte dos produtores brasileiros com editores de som, mixadores ou mesmo estúdios do exterior desde sempre. Já nos tempos de Vera Cruz, passando pela “importação” de editores como Emmanuelle Castro nos anos 1970 (“Bye Bye Brasil”, de 1979, “O Beijo no Asfalto”, de 1981), passando pela necessidade de intercâmbio desde os anos 1980 com estúdios americanos – muito por conta da introdução e da implementação do sistema Dolby no cinema nacional –, e frequentemente verificando muitos filmes nacionais tendo o som ou editado ou mixado nos estúdios da Filmosonido, de Marcos de Aguirre, no Chile, a produção nacional sempre apresenta uma co-operação com técnicos estrangeiros.

Recentemente, uma das presenças mais constantes no universo da mixagem dos filmes nacionais é a do mixador Branko Neskov. Num espaço de tempo de cinco anos, Branko apresenta em seu currículo créditos como “Chico Xavier”, “Primo Basílio”, “Céu de Suely”, “Budapeste” e “Muito Gelo e Dois Dedos d’Água”. E a participação que inicialmente se restringia a filmes que iam ao encontro de Branko para mixagem em seu estúdio Obviosom em Lisboa, Portugal, aos poucos tem-se expandido, com sua visita frequente para mixagens em estúdios brasileiros.
Embora muitos tomem por certa a nacionalidade de Branko como português, por conta de sua localização e pelo sotaque, logo são corrigidos. Sérvio, Branko Neskov nasceu em Subotica, então Iugoslávia. Poucos imaginam que sua vocação inicial era a de biólogo molecular, tendo ingressado para tanto num curso em 1976. Mas logo depois ele mudaria para o curso de montagem de imagem e som na FDU, Faculdade das Artes Dramáticas, na Universidade de Belgrado, Sérvia, onde acabaria a licenciatura em 1981. A carreira em cinema se iniciou em 1979, como assistente de montagem.

O interesse de Branko por som se manifestaria logo na sequência, tendo trabalhado como técnico de som e músico em vários estúdios de música entre 1979 e 1987. Especificamente na área de cinema, passou para o setor de som em 1982, quando começaria a trabalhar como editor de som. A tarefa de mixagem de filmes começou em 1984, primeiramente com filmes documentários e posteriormente com filmes de longa-metragem de ficção. O primeiro filme Dolby Stereo iugoslavo foi mixado por Branko em 1989. Revela o próprio mixador: “O primeiro filme iugoslavo em Dolby Stereo, feito em 1989, chama-se (Let´s Make Love 2) dirigido por Stanko Crnobrnja. O filme era também o meu primeiro Stereo. Na altura, não havia estúdios com capacidade Dolby na Iugoslavia, e por isso fomos fazer as mixagens na Bulgária. Eles tinham (no estúdio de Boyana Film) o equipamento necessário: uma sala com a escuta calibrada e aprovada pela Dolby, projetor de imagem de alta velocidade Siemens e doze leitores de magnético perfurado 35mm. O estúdio tambem tinha um gravador de 4 pistas 35mm e uma com 24 modulos de Dolby A. O ponto fraco de estúdio era a mesa de mixagem: uma Siemens, com 16 canais! Por isso, demoramos imenso tempo fazendo pré-mixagens. Na totalidade, gastamos quatro semanas de mix, uma em Belgrado e 3 na Sofia. Em Belgrado, no estúdio de Avala Film, fiz as pré-mixagens de diálogos, usando a nossa mesa Westrex”.

O desejo de ter seu próprio estúdio se manifestou em seguida, em 1990, em Belgrado. Porém, a guerra que assolou a antiga Iugoslávia começou em 1991, fazendo com que Branko passasse mais tempo pela Europa do que propriamente na Iugoslávia. Como explica o próprio Branko, “nos anos 80 na Europa, a maior parte dos mixadores eram freelancers – menos os britânicos -, e foi uma prática normal um técnico fazer um filme de inicio até o fim. Isto incluía a captação de som nas filmagens, edição, gravação dos foleys e, no final, as mixagens. Assim, quando começamos a procurar estúdios para mixar em Dolby, fomos visitar e trabalhar nos vários estúdios na Europa – Mafilm Audio em Budapeste, Arri Contrast em Berlin, Twickenham e Pinewood no Reino Unido etc.”

O seu mais sério envolvimento com um estúdio fora de Iugoslavia e/ou Portugal, foi com o estúdio AUDITEL, em Paris. “Começou de uma forma ingênua: (o produtor) Antônio da Cunha Telles e eu fomos a Paris para comprar a mesa de mixagem AMS Logic2 porque queríamos instalar uma unidade no nosso estúdio Videocine (hoje Obviosom) em Lisboa. A AUDITEL tinha aberto o processo de falência e os administradores do processo estavam vendendo todo o equipamento. Passadas umas horas de negociações, Antônio da Cunha Telles decidiu comprar o estúdio inteiro e tentar recuperar as operações e eu foi promovido a diretor técnico. Aqui havia quatro salas de mixagem: Audi A com AMS/Neve Logic 2, Audi B com SSL 5000, Audi C com SSL 6000 e Audi D com Lafont. Além disto, todas as salas tinham um ou dois gravadores DASH SONY PCM 3324A e um grande número de leitores e gravadores de 35mm. O grande problema é que faltavam imensas coisas, boa parte do equipamento foi roubada. Nós recuperamos todas as salas, uma por uma, num processo que durou quase um ano. Decidi alterar a escuta no Audi B, melhorar o isolamento no Audi A, reconfigurar a mesa SSL 6000 no audi C, mudar o sistema de sincronização entre projetores de pelicula 35mm e multipistas digitais (abri mão dos produtos da Audio Kinetics e instalei os da Colin Broad)”.

Nessa época em que trabalhava como técnico de captação de som e na pós-produção, Branko decidiu fixar residência em Lisboa, em 1992, depois da experiência que durou um ano e meio reformulando os estúdios da AUDITEL. Todo esse tempo como free-lancer, em 1993 começaria trabalhar na empresa Videocine, seu primeiro emprego registrado. Na mesma Videocine, um ano depois construiria o primeiro estúdio Dolby. Na estruturação do estúdio, instalou um dos primeiros sistemas de mixagem in the box, baseado em Pro Tools, e os primeiros filmes mixados inteiramente em Pro Tools foram feitos em 1999. Na época, era usada a mesa Mackie HUI, visto que não existia Icon ou Pro Control. “A mesa analógica servia como router e matriz de monitoração”, explica Branko.

Em 1998, uma parceria com Pedro Ribeiro levaria Branko a deixar a Videocine e criarem juntos a empresa Pedro & Branko, comprando equipamentos e entrando em parceria com a Videocine. Em 2001, junto com a empresa Tobis, criam a Concept Films, passando a partir de então a gerir a Tobis, no caso de Branko especificamente a Tobis Digital Audio. A parceria durou até o final de 2009, quando Branko partiu para uma grande empreitada, a construção de um novo estúdio em Lisboa. O projeto alcança seu final, e Branko mostra-se empolgado com o resultado, tendo cuidado de cada aspecto da sua nova construção, com uma equipe extremamente zelosa por cada detalhe que envolve a acústica e a funcionalidade de um estúdio de mixagem: “Eu o imaginei como um pequeno estúdio, onde serei capaz de gravar, editar e mixar som para filmes, TV e comerciais. Levou quase um ano até achar o lugar apropriado, com as dimensões aceitáveis, mais do que poderia imaginar. De todo modo, a ideia foi construir uma sala de gravação – com uma técnica decente –, uma sala de mixagem para cinema, certificada Dolby, e duas salas de edição, que serão usadas tanto para imagem e som, dependendo da necessidade”.

Com a estrutura nova, Branko espera continuar atraindo produções brasileiras, que certamente encontrarão em Lisboa uma estrutura apropriada a produções das mais variadas proporções e um profissional com uma longa história de profissionalismo e paixão pelo áudio.

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