fbpx
May 24 2013

Homenagem a Juarez Dagoberto: grande lenda do som no cinema brasileiro

Com tristeza, recebemos a notícia da morte do técnico de som Juarez Dagoberto, aos 81 anos, no dia 23 de maio de 2013. Um grande guerreiro do som direto, uma grande perda para o cinema brasileiro. Juarez Dagoberto foi o responsável pelo som direto de filmes como Macunaíma (1969) e Os Inconfidentes (1972), ambos de Joaquim Pedro de Andrade, Eles Não Usam Black Tie (Leon Hirszman, 1981), trabalhou também com diretores como Nelson Pereira dos Santos e Wener Herzog, dentre muito outros.

Para homenagear Juarez, um dos pioneiros do som direto no Brasil, acima está disponível um trecho da entrevista dele para o documentário Vulgo Som. E abaixo, Tide Borges (técnica de som direto e professora da FAAP) conta um pouco da sua história com essa grande lenda do som no cinema brasileiro. E também disponibiliza a entrevista que realizou com Juarez para sua dissertação de mestrado “A Introdução do Som Direto no Cinema Documentário Brasileiro na Década de 1960“.

Já tinha me formado em cinema pela ECA/USP em 1984, mas trabalhava com som desde 1981. Como as câmeras que eram usadas nos longa-metragens 35mm não eram blimpadas (não eram silenciosas) eu trabalhava nos filmes gravando som guia para dublagem. Eu só tinha trabalhado com som direto em filmes 16mm (documentários e curtas) quando conheci Juarez Dagoberto que já morava no Rio de Janeiro e estava de passagem por São Paulo. Eu tinha assistido Na Estrada da Vida (1983), um filme de Nelson Pereira dos Santos sobre a dupla caipira Milionário e José Rico, e tinha adorado o filme, todo rodado com som direto. Era muito mais trabalhoso filmar em 35mm com som direto, mas o Nelson fazia questão.

Quando conheci o Juarez fui logo me oferecendo para ser sua microfonista num próximo trabalho. E ele me chamou para fazer o Jubiabá (Nelson Pereira dos Santos, 1986), uma adaptação do livro de Jorge Amado. Foi um aprendizado importante prá mim trabalhar com o Juarez numa filmagem do Nelson Pereira dos Santos, que tinha até o Grande Otelo como ator e filmando na Bahia! Ele chamou o filho de um amigo produtor baiano do Nelson para ser assistente: o Rômulo Drummond!

Era um filme de época, com co-produção francesa, com parte da equipe técnica e atores franceses. Era pra ser filmado em Salvador, mas por questões inclusive de som, o Nelson decidiu ir pra uma cidade do interior do Recôncavo baiano – Cachoeira, berço do Candomblé. O personagem do Grande Otelo era um pai de santo e filmamos num lindo terreiro de lá. O Juarez tinha dois Nagras e vários microfones. Lembro da gente gravar uma música para fazer playback com o Batatinha. Naquela época reproduzia a musica num Nagra e gravava um som guia no outro Nagra com claquete e tudo. A gravação era monofônica e tudo era mixado na hora.

O Juarez era muito rígido com todos os procedimentos. Cada um tinha uma função dentro da equipe e ele não admitia que eu ajudasse alguém de outra função. Todo dia a gente entregava as fitas magnéticas com o som direto pra produção (não tinha backup!) e o produtor tinha que assinar um recibo de que eu tinha entregado as fitas e ele tinha recebido. Ele era um exímio microfonista e quando ele achava que a cena era muito complexa, ele mesmo fazia o microfone e eu ficava no gravador assistindo de camarote. O Juarez era considerado um grande profissional de som direto e a agenda dele era bem cheia com filmes brasileiros e produções estrangeiras. Como a filmagem atrasou, Juarez foi embora antes de acabarem as filmagens e Jorge Saldanha e Bruno Fernandes terminaram o filme. 

Muitos anos depois, em 2007, durante o meu mestrado sobre a introdução do som direto nos documentários brasileiros da década de 1960, fiz essa entrevista com ele:

 

Entrevista com Juarez Dagoberto realizada no Rio de Janeiro em 01/08/2007

Juarez Dagoberto: Eu nasci em Belém do Pará e fui muito bebê para São Paulo. Em São Paulo, eu estudei, meu início foi na Poli (USP), mas logo pintou uma escola de cinema, meu irmão era da Força Aérea e gostava da área de cinema. E ele chegou e disse: olha, tem uma escola maravilhosa de cinema aí, não sei que, não sei que, Alberto Cavalcanti… E ele me levou lá. Era o Centro de Estudos Cinematográficos, e isso era o ano de… 1953.

 

Tide Borges: Era aquela escola promovida pela Vera Cruz, para formar pessoas para trabalharem no estúdio

Juarez Dagoberto: É, naquela época a Vera Cruz estava no auge, aliás, naquela época havia três companhias grandes de cinema em São Paulo, três grandes estúdios, que eram a Vera Cruz, a Maristela e a Multifilmes. O curso se compunha de duas fases, a primeira fase era o básico, e no segundo ano já era a especialização. Neste primeiro ano você tinha informações gerais sobre cada setor: direção, fotografia, cenografia, som, artes. Então eu me encaminhei para o lado do som.

 

T.B.: Tinha muita gente?

J.D.: Tinha muita gente…

 

T.B.: E no som?

J.D.: Não, a maioria das atenções eram dirigidas para direção e fotografia, porque achavam que ganhava mais e era mais importante. Na minha turma, por exemplo, entre outros tinha o Roberto Santos. O vestibular era muito pesado e equivalia a vestibular para Direito e mexia muito com a cabeça da gente. Tinha bolsas oferecidas pela prefeitura de São Paulo. Em primeiro lugar ganhou o Roberto Santos e eu ganhei em segundo. Da minha turma faziam parte, além do Roberto Santos, o Luiz Sérgio Person, era uma turma da pesada que depois se tornou profissional.

 

T.B.: Quem dava aula para vocês?

J.D.: Os professores eram na sua maioria aqueles profissionais europeus que o Cavalcanti trouxe para a Vera Cruz. Então tinha um francês que era professor de som, não me lembro bem. E tinha o pessoal da parte da direção que era o Ruggero Jacobbi, tinha os professores italianos, os ingleses.

 

T.B.: No som não era o Rasmussen?

J.D.: Não, o Rasmussen era o cobrão do som da Vera Cruz, ele não ia lá dar aula. Ele era um gênio, acho que era dinamarquês ou norueguês. Esse curso era a coisa mais séria que foi tentada neste país. À partir daí, a coisa começou a andar. Quando o curso terminou, ou quando terminaram com o curso, um dos projetos que seria a prova final, chamado O Grande Momento

 

T.B.: O Roberto já tinha feito este roteiro nesta época?

J.D.:: Ele fez o roteiro durante o curso, e existia a pretensão da realização do filme ser a prova final. Moral da história, o curso explodiu antes do final…

 

T.B.: Mas você terminou?

J.D.: Todos terminaram, foram até o final. Acabou virando mais tarde, o roteiro final de O Grande Momento, quando o curso explodiu, todos os alunos, que já eram poucos, nesta altura, foram convidados para fazer estágio nas empreses que existiam na época, que eram a Vera Cruz, a Maristela e a Multifilmes. O Roberto foi para a Multifilmes, eu fui para a Maristela, foi não sei quem para a Vera Cruz, a turma se espalhou um pouco.

 

T.B.: Tinha equipamento para vocês terem aula, ou era só teórico?

J.D.: Era mais teórico. A gente só foi mexer nos equipamentos nos estágios, nas companhias. Os equipamentos que tinham estúdios profissionais, era o que de melhor tinha no momento nos estúdios americanos. Era o sistema RCA da Vera Cruz, o sistema Western Eletric na Multifilmes…

Os equipamentos magnéticos já tinham chegado da Vera Cruz no finalzinho dos anos 1940 e começo dos 1950, por aí. Na Vera Cruz tinha o sistema fixo ótico da RCA e também tinha os gravadores óticos que saíam no caminhão e iam para as locações, nas unidades externas e também já tinham também os gravadores magnéticos de fita perfurada, RCA, eram magnéticos 35mm perfurados e tinha o 17,5 perfurado.

 

T.B.: Tinha que usar um mesmo gerador para a câmera e o som para garantir o sincronismo?

J.D.: Tinha um gerador que acompanhava a gente que era o gerador do som, que era um gerador menor que abastecia de energia a câmera e o som. O sistema energético era centrado no caminhão de som. Era um caminhão inglês. Do caminhão de som, saía uma linha 220 V que abastecia o motor trifásico da câmera Mitchel e o sistema de som que estava plantado no caminhão. E o sincronismo era perfeito. Quem comandava a distribuição de energia era o caminhão de som. Quando o diretor pedia “câmera!”, era o som que ligava.

 

T.B.: Mas o técnico ficava no caminhão?

J.D.: Não. O recordista é que ligava. O operador, o recordista, ficava dentro do caminhão. Quando pedia “Câmera!”, o recordista é que ligava a câmera e uma outra chave que ligava o gravador. Agora, o mixer, é daí que vem o sound mixer, ficava dentro do cenário. Então, do mixer até o caminhão vinham os cabos, e que determinava os níveis de modulação era o sound mixer de dentro do cenário…

 

T.B.: Mas e quando era externa?

J.D.: Era a mesma coisa. O sound mixer era quem modulava e o recordista, dentro do caminhão, gravava, ligava o Rec. Esse gravador chamado “portátil”, mas era em termo, porque o conceito de portátil é poder andar no caminhão (risos), porque era pesado pra burro. A gente que tinha 17, 18 anos tinha força bastante.

 

T.B.: Era tudo som direto ou era dublado?

J.D.: Nos exteriores, geralmente se fazia som guia por causa do gerador da fotografia era um bruto de um barulho. Por exemplo, eu fiz som direto num filme chamado A Primeira Missa [dirigido por Lima Barreto] em 1960, então a gente colocava um gerador, evidentemente pequeno a 300 metros. Um dos trabalhos pesados era levar os cabos de ½ polegada, “bem levinhos”, com um conector inglês , que às vezes explodia. Um cabo de 300 metros, no meio do mato. Então isso era parte do exercício.

 

T.B.: Mas isso era a equipe de som que tinha que fazer?

J.D.: Era. Esse gerador fazia parte do equipamento de som. Quer dizer, era uma sacanagem, porque 300 metros não é mole não. E também , nesta cidade que a gente fez o Primeira Missa, a produção fez um acerto com a prefeitura da cidade, era Caçapava, Jambeiro, no Vale do Paraíba, em pontos estratégicos que foram estudados na pré-produção, eles colocaram transformadores que a gente ligava num transformador daquele e puxava os cabos…

 

T.B.: Então nas externas do Primeira Missa…

J.D.: É tudo som direto. Esse foi tudo som direto, porque a grande parte dessa produção era dentro de uma igreja, e nas cercanias da igreja, uns 300, 400 metros, então a gente sempre chegava lá. E os microfones já eram de boa qualidade, e a gente conseguia fazer som direto.

 

T.B.: E os microfones, tinham que ficar numas “girafas”?

J.D.: Os microfones eram basicamente no boom. E tinha aquelas “girafas” fixas.

 

T.B.: E o boom era como é hoje?

J.D.: O boom, não houve nenhuma mudança, só que não era como é hoje, mais leve, de fibra de carbono, eles eram um tubo longo de alumínio, de três gomos que a gente enfiava um dentro do outro e regulava o tamanho. Agora, só que o microfone pesava pra burro. A gente usava basicamente, também…eu estou falando basicamente, porque neste espaço da Vera Cruz, porque foi onde houve mais movimento, na verdade, então tinha um microfone que era o bom da época, era um microfone RCA chamado, esqueci o código dele, mas era comumente conhecido como shoe, em inglês, era aquele que tinha exatamente a forma de um sapato. A parte da bobina móvel, da parte mecânica do microfone, era como se fosse um calcanhar, era uma bolota que pesava pra burro. Então nessa época, o microfonista tinha que ser forte, o meu microfonista era um russo de São Paulo, não se ainda é vivo, era Pedro Kopchak. Ele tinha que ser forte fisicamente e inteligente ao mesmo tempo. Fora desse tinha um microfone pequeno americano, que era mais leve, eram não-direcionais mas tinha que chegar perto. Fora disso tinha os microfones Western Eletric, que eram pequenos. Nessa área dos microfones, que eram todos dinâmicos, os direcionais condensadores começaram a aparecer, que eu me lembre, no finalzinho dos anos 1950. Tinha o Electrovoice, e o Sennheiser 804, que eu ainda tenho e que funciona perfeitamente. Eu tenho o Sennheiser 816 que eu gosto muito. Uso muito o Sennheiser 416.

 

T.B.: Mas a Primeira Missa você fez na Vera Cruz, não foi?

J.D.: É. É que na época já era a Brasil Filmes, e o chefão na época era o Abílio Pereira de Almeida, que era outro louco maravilhoso que conseguiu fazer tudo funcionar. Na época da Brasil Filmes, eu fiz muitos filmes. Amor em Concorda, do Abílio, um outro que eu gosto muito do Roberto Farias, que era o Cidade Ameaçada. Então ainda na Vera Cruz, teve um filme maravilhoso, que eu acho engraçadíssimo, produzido pelo Fernando de Barros. Um filme chamado Uma Certa Lucrecia. Tinham três estúdios montados lá. Tinha uma cenografia espetacular do Pierino Massenzi. Ele montou um canal de Veneza dentro de um estúdio. Então toda essa fase da Brasil Filmes..

 

T.B.: Então você conheceu o [montador] Mauro Alice?

J.D.: Ah, o Mauro Alice? Nossa, ele era maravilhoso. Ele cuidava muito bem do som da gente, ele veio dessa escola do Haffenrichter, dos grandes montadores que tinha na Vera Cruz. A meu ver o grande saldo dessa época da Vera Cruz foi ter sido a melhor escola de cinema que esse país produziu. Produziu grandes profissionais, inclusive Mauro Alice, o Galileu Garcia, o Marcelo Primavera, o Geraldo Gabriel, que era um monstro de qualidade, o Chick Fowle que ficou. A gente deveria erigir uma estátua para o Chick. Era aquele inglês maluco que… todo mundo foi embora, mas ele ficou e formou muita gente. A Linx Filmes é uma herança desta época da Vera Cruz.

Bom, voltando para a Maristela…eu tenho um carinho especial pela Maristela, porque foi onde se deu o meu nascimento. E no que tange a equipamento, eles tinham na época um equipamento tão bom quanto tinha nos Estados Unidos, nos estúdios americanos. O sistema era todo Western Eletric, com gravadores ótico de área variável, que existe até hoje. Além do equipamento ótico que a gente gravava o som direto…

 

T.B.: Mas porque, já tendo o equipamento magnético, vocês usavam o ótico?

J.D.: O magnético na época, ainda era um Kinovox 17,5mm, na Maristela, os gravadores portáteis na Maristela, que era um caixote que pesava uns 25, 30kgs. Que era uma maleta que eu carregava. Ao contrário daqueles da Vera Cruz, que precisava de um macho de cada lado, que devia pesar mais de 30kgs. Durante muito tempo ainda, até 1956/1957 a gente ainda gravava direto no sistema ótico. A gente manda o som de dentro do estúdio por cabos imensos, para dentro da central, onde ficava o recordista. O Grande Momento, dentro do estúdio, a gente fez pelo sistema ótico. O outro filme Anabela também gravava direto no ótico.

 

T.B.: Você fez o som do Grande Momento?

J.D.: Eu fiz a parte interna do Grande Momento, ao mesmo tempo, isso era a outra loucura, que eu estava fazendo o Mãos Sangrentas, uma co-produção muito grande Brasil-Argentina, com atores nacionais, mexicanos e argentinos. Eram dois filmes dessa co-produção, então o outro era o Leonor dos Sete Mares. Então durante o dia, agente fazia essa co-produção, que pagava a gente, que terminava às seis horas da tarde. E durante a noite, a gente descansava um pouco, comia alguma coisa, e a partir de umas nove horas a gente começava a armar as filmagens do Grande Momento.

 

T.B.: Quanto tempo vocês ficaram sem dormir?

J.D.: A gente dormia um pouquinho só. Quando a gente é jovem… Então, quando era meia-noite, começava a chegar os atores, que trabalhavam em teatro. Era o Paulo Goulart, o Guarnieri, a Miriam Pérsia. Então a gente tacava o pau até de manhã cedo, de graça, pela arte. Esse filme é lindo. Tem aquela seqüência da entrega da bicicleta, que ele dá uma volta… Eu morava em São Paulo, quando ainda era uma cidade aprazível, com “z”. Ainda tinha bonde.

 

T.B.: Foi o Nelson Pereira dos Santos que produziu. Né?

J.D.: Foi.

 

T.B.: E o Rio, 40 Graus?

J.D.: No Rio, 40 Graus, era uma doideira também. O Mão Sangrenta, a gente filmava muito aqui no Rio, onde tem aquele elevado que vai até a Barra da Tijuca. Era a história de dois fugitivos, de um presídio na Ilha Anchieta. Isso era em 1954, e o Nelson estava fazendo o filme dele aqui no subúrbio do Rio. O produtor brasileiro do Mãos Sangrentas, era o Roberto Acácio, era um cara simpaticíssimo, todo mundo gostava dele. Ele botava grana no Mão Sangrenta de dia e de noite ele emprestava o geradores pro Nelson filmar. Então, em algumas noites, quando Nelson filmava no subúrbio aí, o gerador saía o Mãos Sangrentas e eu vinha junto, era um playback com o Zé Kéti.

 

T.B.: O Nelson fez o curso do Centro?

J.D.: Não. A primeira turma veio a partir de 1952. Tinha o Galieu Garcia, atores. Dessa turma, fazia parte o Nelson Xavier, o Person, o Pavesi…

 

T.B.: Mas vocês usavam um pouco do sistema ótico, um pouco do sistema magnético, mas quando se passou a usar somente o sistema magnético?

J.D.: Quando cinema saiu pá rua já se usava muito o Kinevox, ou o RCA, para fazer som guia, porque aí tinha um controle maior e ficava mais fácil para dublar.

Na época do Uma Certa Lucrecia, a gente ainda gravava ótico dentro do estúdio, mas já existia na Vera Cruz, e eu fui apresentado a um gravador de fita de ¼, chamado Rangertone. E era montado numa mesa enorme, era um equipamento de estúdio. Foi com ele que eu fiquei sabendo do sistema de pulsos do Pilotone para sincronismo. Mas eu acho que eles usavam o Rangertone mais na área de gravação de música. Na Vera Cruz tinha uma central de som espetacular. A central de som, era um cinema de porte médio em relação aos cinemas gigantes que existiam na época. Esse gravador, já tinha o sistema do pulso, e isso já era final dos anos 1950. Eu tenho um carinho especial pelo Kinevox, porque foi o meu primeiro gravador, e a minha empresa chama Kinevox. O Kinevox era o rei do som no cinema na época.

Aí eu fui oficialmente apresentado ao Nagra, isso já era no final dos anos 1958, era um filme chamado Orfeu do Carnaval que até hoje eu acho lindo, e tinha um engenheiro francês chamado Leinhart. O Nagra na época era composto de duas partes, mais ou menos distintas. A parte mecânica tinha uma manivelinha, tipo uma vitrola antiga, e o formato dele era praticamente igual aos Nagras seguintes. E ele tinha uma parte eletrônica que era alimentada por pilhas comuns grandes, e tinha a parte mecânica que era por corda. E então tinha um tempo de duração, por causa da corda. Tinha também um gravador alemão chamado Meinrack, que era um armário, já era um gravador maior. Mas no Nagra a gente dava corda e tinha o negócio do sistema piloto.

 

T.B.: E não era som guia?

J.D.: É. Acho que era som guia. Eu estive nas filmagens somente por alguns dias, só pra ver como era a coisa. O técnico francês foi muito legal comigo, me muitas informações. Mas eu vim conhecer de verdade foi o Nagra III, no ano de 1961. Numa filmagem com uns alemães, que trouxeram para um documentário longo que fizemos no Brasil de ponta a ponta. Era com um Nagra III que eles trouxeram, com a cabeça de Pilotone e o cabo de sincronismo. Foi a primeira vez que eu usei um Nagra. Eles usavam uma câmera Arri 16 não blimpada, mas era pouco ruidosa e o ruído estava dentro da freqüência de corte e a gente fazia a entrevista com a câmera um pouco mais longe.

 

T.B.: E você não pensou em comprar este gravador deles?

J.D.: Não tinha jogo, era um equipamento alugado na Alemanha, não dava. Antigamente se fazia muito filme estrangeiro aqui, eu fazia mais filme estrangeiro que nacional. Antes de comprar um Nagra eu tive um gravador Akai, mas que funcionava só na energia, tinha um gerador que acompanhava a filmagem. Ele tinha quatro motores que controlavam a velocidade, então a possibilidade de falhar o sincro, ele agüentava planos de até um minuto sem sair de sincronismo. Antigamente se fazia muitos filmes de planos curtinhos, aquela coisa campo, contra-campo bem mais picadinha. Depois que eu comprei um Nagra e depois fiquei com mais dois Nagras.

 

T.B.: No Subterrâneos do Futebol era o Nagra do Thomaz?

J.D.: No Subterrâneos era do Thomaz ou era alugado. Eu fiz os filmes desta série, eu fiz o Viramundo, Subterrâneos do Futebol. O [Luiz Carlos] Saldanha ficou um tempo na Europa depois ele trouxe um Nagra. Então quem usava o Nagra dele era eu. Só em 1968 eu comprei o meu primeiro Nagra.

 

Confira também a entrevista com Juarez Dagoberto na revista Filme Cultura nº 37 de 1981 a partir da página 24: Som e Cinema.

 

Leave a Reply